Por Jean-Marc Vivenza
Trecho de sua obra “René Guénon e o Rito Escocês Retificado”
PHALEG: FUNDADOR DAS “LOJAS JUSTAS E PERFEITAS”
Por Jean-Marc Vivenza
O livro de Gênesis, em seus capítulos 10 e 11, nos ensina que Phaleg era descendente de Sem, um dos três filhos de Noé que soube preservar-se da influência perversa de Cam. Assim, o nome de Phaleg, “substituindo” felizmente o de Tubalcaím nos rituais retificados, nos indica que é claramente, e não apenas por uma “loucura piedosa” proveniente do espírito perturbado de um “crisíaco”, segundo o “amável” e caridoso julgamento de alguns autores, que a reforma de Lyon [do Regime Escocês Retificado] quer colocar-se na descendência de Sem. Leiamos particularmente o que Jean-Baptiste Willermoz expõe, em um amparo do qual não se pode sustentar que mostra sinais particulares de perturbação intelectual produzida pelas visões de Mademoiselle Marie-Louise de Vallière (1731-1814), Cônega de Remiremont, irmã do cavaleiro Alexandre de Monspey (1739-1807), i. O. Eques Paulos a Monte Alto, para justificar esta erradicação de Tubalcaím, que se tornou necessária, quando da reunião do Diretório Provincial de Auvergne, em Lyon, em 5 de março de 1785:
“…Não foi considerado uma contradição dar ao Aprendiz esta palavra de reconhecimento [Tubalcaim] depois de tê-lo feito deixar todos os metais que são o emblema dos vícios. De fato, por um lado, é ensinado que não é sobre os metais que o verdadeiro Maçom deve trabalhar; e, por outro lado, é levado a acreditar que Tubalcaim, o Pai e inventor do trabalho sobre os metais, seria o primeiro instituidor da alta maçonaria.
Se Tubalcaim foi o fundador de uma iniciação qualquer, podemos ver qual pode ser seu propósito e objetivos pelos quais as Escrituras dizem sobre isso, e neste século em que tantos maçons se ocupam da alquimia, um Regime que conhece os perigos de tais práticas não deve conservar um nome que, caso perpetuou-se, deve ter sido por desconhecimento ou desatenção de alguns que não perceberam esta relação e esta incoerência, e por isso ainda estão ligados aos que se ocupariam em imitar Tubalcaim, que foi o primeiro a tratar os metais. Se a partir desta observação passarmos a examinar o tempo em que viveu Tubalcaim, poderemos apreciar que foi antes do dilúvio, flagelo com o qual Deus quis apagar da face da terra as obras dos homens. Se a iniciação de Tubalcaim se propagou, esta é impuro, e parece importante romper todas as relações com ela, por isso os maçons são obrigados a deixar os metais, verdadeiro emblema e conservado em todos os Regimes, de modo a separá-los daquele que os trabalhou primeiro. É depois do dilúvio, no tempo da confusão das línguas, que encontramos a razão da fundação de uma iniciação secreta que deve ter se perpetuado e que é o objetivo da busca dos Maçons. Um estudo da verdade feito a partir das mais puras intenções levou a saber que é nos descendentes de Sem que se deve buscar a fundação da verdadeira iniciação. Sem foi abençoado por Noé, e é bem fundamentado acreditar que Phaleg, filho de Héber e descendente de Sem, que foi o pai de todos os filhos de Héber, é o fundador da única e verdadeira iniciação, e esta razão parece determinante para substituir o nome de Tubalcaim pelo de Phaleg. Cam, amaldiçoado por Noé, terá tido a sua iniciação: tudo parece prová-lo, e que a sua palavra de reconhecimento terá sido Tubalcaim; é o emblema dos vícios e convém aos filhos de Canaã que o terão transmitido; mas devemos lembrar que foi dito: que Canaã seja amaldiçoado, que seja o escravo dos escravos em relação a seus irmãos”.
Phaleg incarna, então, como Jean-Baptiste Willermoz nos mostrou amplamente aqui, como fundador das “Lojas Justas e Perfeitas”, a verdadeira “Tradição”, a santa e pura iniciação dos “filhos de Deus” que permaneceram na graça do Eterno. Por outro lado, Daniel Fontaine, em um artigo que trata sobre esta questão, apontará justamente essa eleição prometida de frutíferas bênçãos, por meio de uma criteriosa observação semântica: “…a raiz do nome Phaleg é PHAL e significa uma eleição, uma separação, ao mesmo tempo que uma germinação […]” (D. Fontaine, À propos de Phaleg, Les Cahiers Verts nº 10-12, Grand Prieuré des Gaules, 1992). Da mesma forma, Jean Tourniac, baseando-se nas mesmas conclusões semânticas, lança esta sábia e solene advertência dirigida aos adversários do sentido que representa Phaleg para os Retificados: “Se a profecia de Phaleg, conforme relatada pela tradição judaica, não é ‘regozijante’ – e a Verdade não tem porquê ser consoladora como recorda René Guénon – é altamente saudável para os maçons ‘que têm dois olhos para ver e ouvidos para ouvir’ e que estão atentos aos sinais, como o da Torre de Babel. A maldição profética tem valor de advertência divina e seria imprudente ‘combater’ à Phaleg, por assim dizer, seja considerando-o desqualificado pela Ordem Maçônica em decorrência de sua presença nos graus azuis do Rito Retificado ou vice-versa”. (J. Tourniac, Un nom très juif dans un rituel très chrétien: un certain “Phaleg”, in Vie et perspective de la Franc-Maçonnerie traditionnelle, Dervy, 1978, p. 174).